Depois de muito debate e resistência da oposição – inclusive com o PDT em obstrução – a Câmara aprovou projeto que regulamenta a educação domiciliar. Os deputados acolheram ainda medida provisória que facilita a renegociação de dívidas de estudantes junto ao Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) e mais três que abrem crédito extraordinário para atender estados atingidos por chuvas e oferecer cestas básicas a quilombolas. Por fim, acataram MP que altera incentivos tributários para a indústria química e petroquímica no âmbito do Regime Especial da Indústria Química (Reiq).
Educação domiciliar
Após duas sessões de debates, a Câmara aprovou, na quinta-feira (19), o polêmico projeto que regulamenta a educação domiciliar no Brasil (PL 3179/12), com obstrução do PDT e resistência de toda a oposição. Pela proposta, para usufruir da educação domiciliar o estudante deve estar regularmente matriculado em instituição de ensino, que deverá acompanhar a evolução do aprendizado.
Pelo menos um dos pais ou responsáveis deverá ter escolaridade de nível superior ou educação profissional tecnológica em curso reconhecido. O comprovante de formação deve ser apresentada à escola no momento da matrícula, quando ambos os pais ou responsáveis terão de apresentar certidões negativas criminais das Justiças federal e estadual ou distrital.
“Frontalmente contrário” à proposta, o líder da Oposição, Wolney Queiroz (PDT-PE), argumentou que a educação domiciliar enfraquece a educação nacional, o papel do professor, e “contribui para o assédio e a violência sexual contra crianças, porque o lugar em que se detecta isso é na escola”. Para o deputado, a educação formal tem de ser feita pelo Estado e a escola.
O também pedetista Idilvan Alencar (CE) apelou (em vão) ao “bom senso” dos colegas deputados para que conhecessem melhor o projeto antes de votar. O parlamentar ressaltou que, com a aprovação da medida, qualquer pessoa com ensino médio poderá ensinar física e química, por exemplo, para um aluno em casa. “Isso vem a bem da educação pública? Claro que não. Nós nunca mais vamos poder falar em educação de qualidade nesse país”.
O texto lista algumas obrigações das escolas nas quais o aluno de educação domiciliar estiver matriculado, como a manutenção de cadastro desses estudantes. Os estabelecimentos deverão repassar essa informação anualmente ao órgão competente do sistema de ensino. A escola terá ainda de acompanhar o desenvolvimento do estudante por meio de docente tutor, inclusive com encontros semestrais com os pais ou responsáveis, com o educando e, se for o caso, com o preceptor.
A escola ou a rede de ensino deverá fazer encontros semestrais das famílias optantes pela educação domiciliar para intercâmbio e avaliação de experiências. Já o conselho tutelar, nos termos da legislação, deverá fiscalizar a educação em casa.
No caso de estudante com deficiência ou transtorno global de desenvolvimento, equipe multiprofissional e interdisciplinar da rede ou da instituição de ensino em que ele estiver matriculado deverá fazer uma avaliação semestral de seu progresso.
Para garantir o aprendizado na educação domiciliar, os pais deverão cumprir os conteúdos curriculares de cada ano escolar do estudante de acordo com a Base Nacional Comum Curricular, admitida a inclusão de conteúdos adicionais.
Os responsáveis terão de garantir a convivência familiar e comunitária do estudante e a realização de atividades pedagógicas para promover a formação integral, contemplando seu desenvolvimento intelectual, emocional, físico, social e cultural. Nesse sentido, terão de manter registro periódico das atividades pedagógicas realizadas e enviar, à escola em que o aluno está matriculado relatórios trimestrais dessas atividades.
Quando a escola à qual o aluno estiver vinculado for selecionada para participar de exames do sistema nacional, estadual ou municipal de avaliação da educação básica, o estudante domiciliar deverá também participar.
Quanto às avaliações para certificar a aprendizagem, o substitutivo remete sua realização à escola em que o estudante está matriculado. Para a educação pré-escolar, será realizada uma avaliação anual qualitativa e cumulativa dos relatórios trimestrais que os pais devem enviar.
Nos ensinos fundamental e médio, além desses relatórios, deverá haver avaliação anual com base no conteúdo curricular, admitida a possibilidade de avanço nos cursos e nas séries, conforme previsto na Lei de Diretrizes e Bases (LDB). Se o desempenho do estudante nessa avaliação anual for considerado insatisfatório, uma nova avaliação, em caráter de recuperação, será oferecida no mesmo ano. Quanto à avaliação para o estudante com deficiência ou transtorno global de desenvolvimento, ela será adaptada à sua condição.
Os pais ou os responsáveis legais perderão o direito de optar pela educação domiciliar em quatro situações:
– se forem condenados pelos crimes tipificados nas leis citadas;
– quando a criança, na educação pré-escolar, mostrar insuficiência de progresso em avaliação anual qualitativa em dois anos consecutivos;
– se o estudante do ensino fundamental ou médio for reprovado em dois anos consecutivos ou em três anos não consecutivos ou se não comparecer a elas sem justificativa; ou
– se o estudante com deficiência ou transtorno global do desenvolvimento, de acordo com suas potencialidades, obtiver insuficiência de progresso em avaliação semestral por duas vezes consecutivas ou três vezes não consecutivas.
Renegociação do Fies
O plenário acolheu também na semana medida provisória que altera mais uma vez as regras para negociação de dívidas com o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies). Pelo texto (MP 1090/21), as condições valerão para contratos assinados até o segundo semestre de 2017, momento a partir do qual o programa foi reformulado.
As regras substituem aquelas previstas no Programa Especial de Regularização do Fies criadas pela Lei 14.024/20 em razão da pandemia de Covid-19. Nesse programa, as reduções eram menores que as propostas pela MP 1090/21, e quem aderiu a ele não poderá compensar os pagamentos feitos na ocasião com as novas regras da renegociação.
Para estudantes com débitos vencidos e não pagos há mais de 90 dias e até 360 dias, a MP concede desconto de até 12% do valor principal e abatimento total dos encargos para a liquidação do restante à vista. O tempo é contado até a data de publicação da MP (30 de dezembro de 2021). Se optar pelo parcelamento, haverá desconto de 100% de juros e multas e prazo de até 150 meses para quitação.
Esse prazo poderá ser maior se o estudante optar por migrar para o desconto consignado em folha de pagamento, devendo pagar um valor mínimo nos meses em que não houver consignação, conforme estabelecido pelo CG-Fies.
Os endividados com débitos vencidos há mais de 360 dias, contados da MP, terão descontos maiores se estiverem cadastrados no CadÚnico do governo federal ou se tiverem recebido auxílio emergencial em 2021. Os descontos serão de 99% sobre o valor consolidado da dívida, inclusive principal, e o restante deve ser pago à vista em 15 parcelas corrigidas pela Taxa Selic.
Os demais estudantes com esse atraso maior no pagamento poderão quitar a dívida com desconto de até 77% do consolidado. O texto original previa desconto de 86,5%. O texto proíbe a realização de transações que impliquem descontos totais maiores que 77%, exceto para inscritos no CadÚnico e recebedores do auxílio.
A MP aprovada foi regulamentada parcialmente por resolução do Comitê Gestor do Fies (CG-Fies), que fixou o período de 7 de março a 31 de agosto de 2022 para o interessado procurar o banco a fim de negociar a dívida.
Crédito extraordinário
Na semana, os deputados ainda acataram três medidas provisórias com liberação de crédito extraordinário. Uma delas (MP 1092/21) destina R$ 700 milhões para o Ministério da Cidadania atender regiões afetadas pelas chuvas de dezembro. Outra, Medida Provisória 1097/22, libera R$ 418 milhões em favor do Ministério da Infraestrutura a fim de viabilizar a reconstrução de rodovias que também foram destruídas pelas chuvas em 14 estados. Já a Medida Provisória 1087/21 traz verba extra de R$ 167,2 milhões para o Ministério da Cidadania distribuir cestas de alimentos à população quilombola.
Incentivos para a indústria química
Por fim, o plenário aprovou a Medida Provisória 1095/21, que altera incentivos tributários para a indústria química e petroquímica no âmbito do Regime Especial da Indústria Química (Reiq). De acordo com o substitutivo aprovado, em vez do fim imediato do incentivo, como constava da MP original, haverá uma nova transição até 2027, com extinção a partir de 2028.
Segundo a MP original, as alíquotas cheias de 1,65% para o PIS e de 7,6% para a Cofins começaram a valer desde 1º de abril deste ano, e vai vigorar durante o ano de 2022. A transição proposta ficou mais longa a anterior, revogada pela MP. Assim, em vez de o incentivo acabar em 31 de dezembro de 2024, acabará em 31 de dezembro de 2027.
Para 2023, continuarão as alíquotas previstas pela Lei 14.183/21, de 1,39% e 6,4% para o PIS e a Cofins, respectivamente. De 2024 a 2027, serão de 1,52% e 7%, respectivamente.
O fim progressivo dos incentivos alcança ainda o PIS/Pasep-Importação e a Cofins-Importação com as mesmas alíquotas para cada categoria de imposto.
Os produtos abrangidos no Reiq são etano, propano e butano, nafta petroquímica e condensado destinado a centrais petroquímicas e outros produtos usados por indústrias químicas.
Antes da MP, as empresas participantes do Reiq sujeitas ao regime de não cumulatividade desses tributos tinham direito ainda a incorporar em sua contabilidade créditos presumidos com alíquotas maiores (1,65% de PIS e 7,6% de Cofins) que as pagas na comercialização. Esses créditos são utilizados para compensar outros tributos ou para ressarcimento perante a Receita.
No entanto, segundo o texto aprovado, as empresas somente poderão contar com os créditos gerados por essas alíquotas se firmarem um termo de compromisso sobre normas ambientais, de segurança e medicina do trabalho e manutenção de emprego.
Enquanto não editado regulamento do Poder Executivo sobre esse compromisso, o crédito será calculado com as alíquotas menores previstas na transição de aumento gradativo do PIS/Cofins, gerando descontos menores no pagamento de outros tributos.
Com informações da Agência Câmara de Notícias